Anchieta Fernandes
O escritor Moacy Cirne publicou, em 2004, o livro “A invenção de Caicó”
(Sebo Vermelho Edições), precioso hino de amor a uma cidade que não é a do seu
nascimento (nasceu em Jardim do Seridó) mas
onde se criou e onde adubou os primeiros alumbramentos culturais. Mas o título
do livro de Moacy é pouco, para o lugar que, antes sendo sítio Cuó, depois
Povoado Seridó, adquiriu o status de município pelo Decreto de 28 de Abril de
1788, instalando-se com a denominação Vila Nova do Príncipe (homenageando-se
com este nome Dom João VI) a 31 de Julho de 1788. Está comemorando, portanto,
220 anos. Aqui homenageio a terra das famosas bordadeiras com uma espécie de
texto calidoscópico, e não uma máquina do tempo sequenciadamente cronológica,
mostrando um pouco das muitas “invenções” caicoenses, sua história, datas
importantes e coisas pioneiras ou que se marcaram apenas como curiosas.
Caicó tem, por exemplo, um Observatório Sismológico, que em 1984
participou de um teste para detectar explosões nucleares em todo o mundo. É o
único município do Rio Grande do Norte que possui uma Aldeia SOS, que faz parte
de um sistema de aldeias infantis fundado em 1949, na Áustria, por Hermann
Gneiner, e onde crianças órfãs são recolhidas em casas-lares, cuidadas por mães
sociais, recebendo educação regular e cursos profissionalizantes, só saindo da
aldeia quando atingem a maioridade. Os diversos Arcos do Triunfo que existem em
outros países, lembram vitórias materiais, ações de guerra. Em Caicó, à entrada
da Praça da Matriz de Santana, está um Arco do Triunfo diferente: inaugurado a
15 de Agosto de 1958, lembra a passagem da imagem de Nossa Senhora de Fátima
pela cidade, a 22 de Novembro de 1953. Lembra o triunfo espiritual da fé na mãe
de Jesus Cristo.
Em
Dezembro de 1980, a
Sudene implantou em Caicó, na fazenda Belém, um modelo de irrigação de
plantações de abacaxi denominado “Xique-Xique”, experiência pioneira no sertão,
já que o abacaxi é cultura peculiar ao litoral. Visitando Caicó em 1922, o
Marechal Rondom, sertanista/indianista, chegou tarde da noite, encontrando a
cidade quase totalmente na escuridão. Com exceção da Biblioteca Olegário Vale
(inaugurada a 14 de Setembro de 1919), na Praça da Liberdade, onde um grupo de
rapazes estava estudando, à luz de lampiões de gás. O primeiro jornal
seridoense, “O Povo”, circulou em Caicó desde o dia 09 de Março de 1889, sob a
direção/redação de Diógenes da Nóbrega, Olegário Vale e Manoel Dantas. A
impressão do jornal era na tipografia de José Renaud, à Praça do Mercado
(atualmente, denominada Praça Dinarte Mariz). A tiragem era semanal.
REPUBLICANISMO, PROGRESSOS ETC.
O primeiro
núcleo de propaganda republicana no Rio Grande do Norte foi, segundo o
historiador Muirakytan Kennedy de Macedo (v. seu livro “A Penúltima Versão do
Seridó – Uma História do Regionalismo Seridoense”, Edição Sebo Vermelho, Natal,
2005), em Caicó, fundado a 25 de Julho de 1886, sob a presidência do
octogenário Manoel Sabino da Costa. Quando foi criado em 1788, o município de
Caicó (ou, então, Vila Nova do Príncipe) abrangia quase todo o Seridó no
Estado, pertencendo-lhe então os futuros municípios Acari (desmembrado em
1833), Jardim do Seridó (desmembrado em 1858), Serra Negra do Norte
(desmembrado em 1874), Jucurutu (desmembrado em 1948), Jardim do Piranhas
(desmembrado em 1948), São Fernando (desmembrado em 1958) e Timbaúba dos
Batistas (desmembrado em 1962). Mas um grande e importante município
seridoense, Currais Novos, não lhe pertenceu.
A 19 de Janeiro de 1955, foi instalado em Caicó o Primeiro Batalhão de
Engenharia e Construção. A 1º de Maio de 1963, foi inaugurada em Caicó a
Emissora de Educação Rural, a primeira no Seridó com o objetivo de transmitir
aulas à distância. O primeiro automóvel que chegou a Caicó foi a 27 de Março de
1919, e pertencia a Manoel Coriolano de Medeiros. Segundo o livro “Sertões do
Seridó”, de Oswaldo Lamartine (1980, Centro Gráfico do Senado Federal,
Brasília, DF), quem primeiro requereu terras no Rio Grande do Norte para
construção de açudes foi o padre Manoel de Jesus Borges. Isso foi no ano de
1706. Não se tem certeza se os açudes do padre Borges se concretizaram. O que
se pode afirmar com certeza é que o açude Mabanga, construído no ano 1842 nas
terras que seriam depois o município Caicó, foi um dos primeiros no Estado.
A luz elétrica de Caicó foi inaugurada a 21 de Abril de 1925, superando
definitivamente a fase dos lampiões a querosene e a gás. A 01 de Agosto de
1928, o primeiro avião sobrevoou e pousou em Caicó, pilotado por Depecker,
trazendo como passageiros o governador do Estado, Juvenal Lamartine, e George
Piron. A finalidade era inaugurar o primeiro campo de aviação da cidade, o que
foi concretizado na então chamada “Baixa do Arroz”. Em Setembro de 1963,
começou a funcionar em Caicó a Usina de Beneficiamento do Algodão da Firma
Algodoeira Seridó Comércio e Indústria S.A. A 05 de Maio de 1929, foi fundado e
instalado o Banco Rural de Caicó, tendo Eduardo Gurgel de Araújo como seu
primeiro Diretor-Presidente. Em Maio de 1968, foi criado em Caicó o Museu do
Seridó.
Além dos grandes nomes da política (José Augusto Bezerra de Medeiros),
do jornalismo (Manoel Gomes de Medeiros Dantas), do judiciário (Amaro
Cavalcanti), das artes (o pintor Eladio L’eraistre Monteiro, o cineasta Augusto
Ribeiro Júnior) – nasceu também em Caicó um estranho poeta; batizado Francisco,
teve como sobrenome Manoel de Souza, ao que teria acrescentado Forte,
homenageando um dos fundadores de Caicó, Manoel de Souza Forte. Tendo sido
descoberto por Nei Leandro de Castro, em um bar da Cinelândia, no Rio de
Janeiro, em 1990, sua poesia erótica e debochada foi divulgada depois por Nei e
Moacy Cirne com a assinatura que o poeta assumia, Chico Doido de Caicó. Alunos
da Universidade Federal Fluminense, de Petrópolis, escolheram-no como patrono
(póstumo) na formatura da turma de 1993. Foi feita uma adaptação teatral de sua
poesia.
Importância de Caicó para a música e o cinema brasileiro: o coco
paraibano “Oh, mana, deixa eu ir” (folclore), que já fora recolhido por
Villa-Lobos, e depois cantado por Milton Nascimento, foi incluído no filme
“Aruanda” (1960, dirigido por Linduarte Noronha), cantado por Othamar Ribeiro,
neste que é um dos mais importantes documentários brasileiros, iniciador da linguagem
do Cinema Novo. Pois bem: a quadrinha, na letra termina homenageando a terra do
poeta, romancista e ensaísta Nei Leandro de Castro (cujo romance “As Pelejas de
Ojuara” foi recentemente adaptado para cinema por Moaci Góes, alcançando bom
público em nível nacional), dizendo: “Oh, mana, deixa eu ir/ Oh, mana, eu vou
só/Oh, mana, deixa eu ir/Para o sertão de Caicó”.
Em 1910, durante a Festa de Sant’Ana, foram exibidos os primeiros filmes
em Caicó. Em
1926, Caicó recebia o presidente Washington Luiz, o primeiro presidente a
visitar a cidade. Em Janeiro de 1929, o poeta, contista, romancista e ensaísta
brasileiro Mário de Andrade, um dos organizadores da Semana de Arte Moderna de
1922, visitou Caicó. Em 09 de Março de 1974, foi inaugurado o 1° Núcleo Avançado da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte, para a população seridoense. As atividades culturais
caicoenses se espalham sempre para outras regiões, outros municípios. A 03 de
Julho de 1973, o Diário Oficial do Estado publicou o Estatuto do Grêmio
Cultural Caicoense, funcionando em Natal.
Texto publicado no Suplemento Cultural "Nós, do RN" agosto de 2008
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