Homero de O. Costa, prof. do Departamento
de Ciências Sociais da UFRN.
Entre os dias 2 a 7 de
setembro foi realizada a Semana Nacional de Luta pela Reforma Política
Democrática, uma iniciativa de mais de 400 entidades da sociedade civil
articuladas na Plataforma Nacional dos Movimentos Populares para uma
Constituinte Exclusiva para a reforma do sistema político brasileiro. O
objetivo da semana foi o de consultar a população para saber se ela é ou não
favorável à convocação de um plebiscito para a realização de uma Constituinte
Exclusiva e Soberana do sistema político e ao mesmo tempo, recolher assinaturas
para um Projeto de Lei de Iniciativa Popular para uma “reforma política
democrática”.
A iniciativa é louvável porque
se depender apenas do Congresso Nacional, não haverá nem plebiscito e muito
menos uma reforma política. Por isso, a mobilização da sociedade civil
organizada. A Plataforma Nacional dos Movimentos Populares elaborou um conjunto
de propostas para uma reforma política e entre as mais importantes estão duas
que também tem sido defendida pelas comissões especiais de reforma política do
Congresso Nacional desde 1995, sem que sequer sejam votadas em plenário.
Trata-se do fim das coligações em eleições proporcionais que, se aprovada
significaria o fim das legendas de aluguel, que para aderir às coligações (já
que sozinhas não teriam chances eleitorais) negociam, em troca de cargos e
benesses, o horário eleitoral de rádio e televisão e, talvez a mais importante,
porque decisivo nas campanhas
eleitorais, aprovar o financiamento público de campanhas, proibindo o
financiamento privado.
Se
o Congresso Nacional não faz sua parte, a justiça eleitoral (TSE) tem feito e a
cada eleição, avança no processo de moralização da eleições, com rigorosa
fiscalização do processo eleitoral e através do artigo 36 da resolução
23.406/2014, contribui para a transparência desse processo, tornando públicas as informações das
prestações de contas dos partidos, candidatos e comitês financeiros, com a
discriminação dos recursos arrecadados para financiamento de campanhas
eleitorais. E nesse sentido, as duas parciais divulgadas a primeira em agosto e
a segunda no início de setembro (dia 6) revelam as distorções e desigualdades
do processo eleitoral brasileiro no qual o poder econômico, com o financiamento
privado de campanhas, é cada vez mais decisivo. As eleições são cada vez mais
caras. Segundo dados do TSE relativo às eleições de 2010 os gastos para campanha
de um deputado federal foi, em média, R$ 1,1 milhão e para as eleições de
outubro de 2014 a projeção é de que sejam em torno R$ 3,5 milhões (e R$5,6 milhões para senador).
Se são tão caras, quem as financiam? Basicamente as grandes empresas
(construtoras, em particular) e os bancos. Em 2010, 91% do total arrecadados
pelos partidos e candidatos foi de empresas e em 2014, a segunda parcial revela
que chega a 95%, no qual apenas três empresas, sendo duas construtoras (OAS e
Andrade Gutierrez) e o frigorífico JBS doaram 39% do total arrecadado. Há, portanto, um seleto grupo de doadores. De
15.733 pessoas físicas e jurídicas que contribuíram com mais de R$ 100 reais na
primeira prestação de contas feitas em agosto de 2014, apenas 32 empresas foram
responsáveis por 50% do total arrecadado, tendo o frigorífico JBS se destacado
como maior doador (qual será o interesse de um frigorífico em financiar campanhas
eleitorais?) com R$ 59 milhões, seguida pela construtora OAS. Na segunda parcial (divulgada no dia 6 de setembro
de 2014), conforme levantamento da Transparência Brasil e
Estadão Dados, a Construtora OAS, o frigorífico JBS e a Construtora Andrade Gutierrez,
juntas, doaram quase R$ 64 milhões para os três principais candidatos a
presidente da República. A OAS doou R$ 17 milhões, a Ambev (fabricante
de bebidas) R$ 16,7 milhões e a Construtora Queiroz Galvão, R$ 11,3 milhões,
além de bancos (Safra, Bradesco, BTG Pactual, Itaú Unibanco – e que doou mais
dinheiro para o candidato do PSDB, Aécio Neves – R$ 2 milhões), empresas de telecomunicações
como a telemont, hospitais (9 de julho, de São Paulo), planos de saúde (Amil
Assistência Médica Internacional S/A que doou R$ 4 milhões para a campanha da
presidente Dilma Rousseff e Bradesco Vida e Previdência, entre outras), além de
construtoras como Norberto Odebrecht, UTC Engenharia S/A (doou R$ 5 milhões para a campanha da presidente
Dilma Rousseff e R$ 1 milhão para a de Aécio Neves), MRV Engenharia e
participações S/A, entre outras que doaram para candidatos e partidos
distintos, que mostra o pragmatismo dos doadores. A OAS é a líder no ranking de doações, com R$ 26,1
milhões repassados nos três primeiros meses de campanha. A principal
beneficiária foi a presidenta Dilma Rousseff, que recebeu 77% do total. O JBS
vem logo a seguir, com R$ 26 milhões (inclui doações da empresa Flora Produtos
de Higiene e Limpeza, do grupo JBS) e a Andrade Gutierrez que doou R$ 11,8
milhões. No total, a maior beneficiada foi a
presidente Dilma Rousseff que até o momento (segunda parcial) já arrecadou R$
123,6 milhões (cerca de cinco vezes o valor declarado pelas contas da campanha
presidencial do PSB, partido de Marina Silva), ou seja, mais da metade dos
cerca de R$ 200 milhões declarados por todos os presidenciáveis nas duas
parciais entregues ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em segundo lugar vem
Aécio Neves (PSDB), com R$ 44,5 milhões, e em terceiro, Marina Silva cujo partido
(PSB) declarou ter arrecadado R$ 24 milhões.
O que vemos é poder econômico sendo
cada vez mais decisivo nas campanhas eleitorais. Pelos dados da segunda
parcial, são as grandes empresas e bancos que financiam as campanhas eleitorais
e, assim a composição do Congresso Nacional (deputados federais e senadores) a
exemplo da atual legislatura, deverá ser eleita, majoritariamente, financiada por
eles e através de coligações (uma minoria é eleita com votos próprios) e a
possibilidade de uma reforma politica que tenha o financiamento público como um
dos objetivos, certamente não será aprovada. Daí a importância de iniciativa
como a da Plataforma dos Movimentos Populares pela reforma do sistema político,
porque, sem pressão população, não haverá reforma política e as eleições, cada
vez mais caras, dependerão de financiamento de empresas, com suas consequências (danosas) para a representação política e para o sistema
politico brasileiro.
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