Severino
Vicente
Para compreendermos a
riqueza de ritmos e melodias contidos na música popular brasileira, num país de
proporções continentais, é necessário um olhar que remonte há duzentos anos
atrás, onde estão fincadas suas raízes. As cidades de Salvador e Rio de
Janeiro, os centros mais adiantados do Brasil à época, são responsáveis pelo
surgimento dos primeiros gêneros musicais brasileiros. A modinha e o lundu.
A modinha é um gênero
musical de origem ibérica que ganhou prestígio no final do século XVIII nos
salões da nobreza portuguesa, sofrendo influência da valsa, saiu do popular
para o erudito. Entre os seus mais importantes compositores destacamos o Padre
José Maurício e Carlos Gomes, autores das famosas modinhas “Tão longe de mim
distante” e “Suspiros d’Alma”.
O lundu, uma dança de
negros, marcada pela ironia e umbigada. Conseguiu se afirmar com o compositor
Domingos Caldas Barbosa, alcançando os salões da fidalguia da metrópole. Este
ritmo saltitante foi sucesso e proporcionou fortuna a compositores como
Francisco Manuel da Silva, autor do Hino Nacional, com o “Lundu da
Marrequinha”.
Do lundu originou-se
o choro no Rio de Janeiro, com músicos que se reuniam para alegrar festas em
casas de família. Davam arranjos às melodias à sua maneira, tocando em estilo
chorado que eram denominados de “chorões” pela população. Um dos mais
importantes compositores de “chorinhos” foi Vila-Lobos, participante assíduo
dessa confraria.
Estávamos no final do
século XIX quando surge a consagrada Chiquinha Gonzaga, a “Vovó da música
popular brasileira”, primeira mulher no Brasil a participar de um grupo de
chorões com sua famosa marcha “Ó abre alas”, inspirado nos ritmos da
musicalidade negra que deu ao carnaval carioca algo de inconfundível.
O objetivo do grupo dos
chorões era adaptar esses ritmos a uma tendência puramente brasileira,
começando com o maxixe na década de 1920, substituído pelo samba, espalhando-se
pelos centros urbanos como música típica dos brasileiros com Ernesto dos Santos
(Donga) através do sucesso “Pelo telefone”. A partir daí o país é invadido por
este contagiante ritmo musical originado do batuque dos negros e que tem no
compositor mineiro Ary Barroso um dos principais protagonistas na década de
1940: “No tabuleiro da baiana” e “Aquarela do Brasil”, sucesso absoluto na voz
inconfundível de Carmem Miranda. O samba chegou ao morro carioca, conquistou as
avenidas iluminadas e, através das escolas de samba, tornou-se a maior atração
do carnaval carioca e contagiou o Brasil.
Derivada de ritmos
negros do carnaval carioca surge a marcha, “Ó abre alas”, de Chiquinha Gonzaga.
Samba e marcha no século passado ganharam prestígio e sucesso com aparecimento
do rádio e das gravadoras de discos, com músicos e compositores oriundos da
classe média que se apossaram desses ritmos para encher o Brasil de alegria,
ginga e boemia. Eram marchinhas, marcha-rancho, samba-canção, samba de breque,
samba-choro, tendo Pixinguinha como um dos seus mais autênticos representantes.
“Carinhoso”, quem não canta? Um clássico: “Meu coração/ não sei por que/ Bate
feliz/ quando te vê (...)”.
Outros valores
sacodem o Brasil, vou citar apenas alguns: Noel Rosa, “O orvalho vem caindo”,
“Estrela d’alva”; Zequinha de Abreu, “Tico-tico no fubá”; Lamartine Babo, “O
teu cabelo não nega” e “Juju balangandans”; Ataulfo Alves, “Saudades da
Amélia”; Joubert de Carvalho, “Maringá”. Apesar de existir outros grandes nomes
vou ficando por aqui com o Zé Kéti e sua “Mascara Negra”, Dorival Caymi e suas
melodias inesquecíveis: “Marina, Morena você se pintou”.
Depois vem a Bossa
Nova, o Tropicalismo, os ritmos afro-americanos e, nos dias atuais, o brega
popularesco. “Você não vale nada/ Mas eu gosto de você”. “O Garçom tá doido/
Botou água na cachaça/ Garçom baitola, garçom baitola (...)”.
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