27 de abril de 2014

Natal: O Progresso chega de bonde



Luciano Fábio Dantas Capistrano
Historiador/SEMURB - Professor/Esc.Est. Myriam Coeli

A história, da expansão urbana de Natal deveria ser disseminada nas nossas escolas de ensino fundamental e médio, pois é lá nos bancos escolares que se forma grande parte da consciência cidadã. É com o objetivo de contribuir neste processo de conhecimento, que busco, através deste espaço democrático, discorrer sobre a urbanização da cidade de Câmara Cascuda. Vejamos, então, um pouco sobre, a evolução de Natal.
A década de 1920 foi um marco na história urbanística de Natal. O tema da higienização pública, abordado pelo médico Januário Cicco em “como se higienizaria Natal”, passou a fazer parte das preocupações da engenharia. Estudos técnico-científicos foram financiados pelos governos, estadual e municipal, com o objetivo de prover Natal de saneamento e rede de abastecimento de água potável. Neste sentido:”Iniciou-se, então, um período de desenvolvimento de estudos técnico-científico para o embasamento das propostas de melhoramentos para a cidade. Dentre esses se destacam: os levantamentos das fontes de abastecimento d’água, realizados em 1924 pelo engenheiro Henrique Novaes; o reconhecimento do nível topográfico do bairro da Ribeira, realizado em 1925, para embasar as obras de calçamento do sistema viário que seriam efetivadas durante a administração do engenheiro Omar O’Grady, bem como as análises geofísicas sobre o nível do subsolo natalense em água potável, também a cargo dessa Intendência Municipal” (FERREIRA, 2008, p. 95).
Neste novo contexto é criada a Comissão de Saneamento de Natal (CSN), tendo como engenheiro-chefe Henrique Novaes, seguindo as normas do decreto nº 231 de 26 de abril de 1924, assinado pelo governador José Augusto de Medeiros. Em 17 de maio de 1924, o jornal a República publica o relatório da CSN, informando ao governador da execução de seus serviços.
Prestação de contas, o relatório do engenheiro Henrique Novaes ganha caráter importante no estudo dos mananciais de água potável, apresentando várias fontes de grande potencial para o abastecimento da cidade. Analisa neste estudo a bacia de Pitimbu, as lagoas de Manoel Felipe e do Jiqui, verificando também a possibilidade de utilização da lagoa de Extremoz no fornecimento de água.
O progresso “chegava” de bonde, transformando e redesenhado a cidade. As dunas, o Potengy e as praias, beleza naturais da terra de Câmara Cascudo, por algum tempo ficaram como despercebidas dos cidadãos desejosos do moderno. As letras natalenses registram este novo momento, como Jorge Fernandes em seu “Livro de Poemas”: “...E os passageiros todos nem olham pro mar...Só vêem o bonde novo...”
A paisagem urbana se transforma, é o bonde a iluminação pública, serviços executados pela empresa Força e Luz, fazendo de Natal uma cidade de ares modernos, avançando, mesmo de forma lenta, para além de seus limites urbanos, abrindo novos caminhos, construindo novos lugares de morada. Redefinir os limites estabelecidos com a promulgação da Lei nº 4 de 1929, era uma necessidade das novas demandas, de uma cidade que constantemente afirmava-se como capital potiguar.
Natal cidade dos Reis Magos, a Nova Amsterdã, transforma-se no Trampolim da Vitória, localização mais próxima das Américas em relação ao Continente Africano, foi na década de 1940 escolhida pelos norte-americanos para sediar uma base de apoio à suas forças militares, durante a Segunda Guerra Mundial. Como diz a poesia, Natal virou mesmo Hollywood, very good era dito em cada esquina. O esforço de guerra fez Natal saltar de um contingente de aproximadamente 50.000 habitantes para mais de 60.000, crescimento, este, causador de problemas de moradia e abastecimento. A cidade cosmopolita foi palco da maior mobilização de militares americanos fora dos Estados Unidos. Diante desta situação foram implantados novos mecanismos de infra-estrutura na capital Potiguar.
Souza (apud. LIMA, 2001) registra que nesse período houve, de fato, um saldo migratório de 38.237 habitantes. Este crescimento populacional foi resultado das oportunidades surgidas, com a “indústria” da guerra. Aqui chegaram das mais diversas cidades do interior e também de outros estados, homens e mulheres, trabalhadores desejosos de melhores condições de vida. A cidade mudou: Em pouco tempo, Natal deixou de ser uma pacata capital de estado nordestino, assumindo ares de uma cidade cosmopolita. A cidade pós-Segunda Guerra, expandiu-se, novas terras foram ocupadas e o antes limite urbano foi alem das áreas rurais. Novos problemas e novos desafios surgiram com a Natal depois da Guerra.
O pós-guerra além da alegria com a chegada de tempos de paz, foi caracterizado também com uma forte desaceleração da economia. A população crescente criava urgentes demandas por habitações, provocando a ocupação irregular da cidade, neste sentido à expansão urbana ocorre sem planejamento fazendo nascerem novos núcleos de moradia. Como informa Miranda (1999, p. 75): Nasciam novos núcleos de população de baixa renda, marginalizada por falta de emprego, popularmente classificados como biscateiros, tendo como principal ocupação ser vendedores ambulantes, lavadeiras, empregadas domésticas e outros.
Esta expansão urbana desordenada causava uma sobre-carga, em serviços, como por exemplo, o de abastecimento de água, criando deste modo, a necessidade de poder público construir ou ampliar a rede de atendimento para os novos locais de moradia, que se estendiam para além das “Quintas”. Nas décadas de 1950 e 1960, foram registrados diversos loteamentos, a cidade sofria grande pressão do mercado imobiliário. Estas mudanças: [...] iriam colocar em xeque o controle e a gestão do espaço urbano e dos serviços públicos, [...] Tais mudanças se referem tanto ao aumento do poder do setor imobiliário na ordenação física da cidade como à forma de definição do parcelamento e da trama viária e a rapidez com que inúmeros loteamentos foram projetados, registrados e implantados, embora, muitas vezes, apenas parcialmente ocupados. (FERREIRA, 2008, p. 224-225).
O poder público municipal, diante do quadro construído a partir destas ocupações, procurava pensar o espaço urbano, planejar a cidade. Surgia, então, órgãos especializados em planejamento, nesta perspectiva o prefeito Agnelo Alves, entrega aos cidadãos em 1968, o Plano Urbanístico e de Desenvolvimento de Natal. Considerado o primeiro Plano Diretor de Natal, apesar de não ter sido implementado na sua totalidade, seu êxito foi a “A formação de um corpo técnico especializado em planejamento urbano, o que possibilitou a criação de órgãos específicos na execução de ações urbanas. (NATAL, 2007, p. 33)”.
Estas intervenções urbanas segundo Lima (2001), seguiram a lógica do Plano Polidrelli, de segregação social, os excluídos sociais continuavam sendo empurrados para os limites de Natal. Deste modo, a parcela carente da população, subia as dunas, descia as encostas, habitava as áreas “distantes” da cidade. Natal como diz o poeta:

...cresce paralela
aos cursos do rio e do mar
e pelo sul se bifurca
em duas pernas de A.

em ambas, até bem pouco
áreas de todo desertas,
se estendem: Boa Sorte,
bairro Nova Descoberta

e o alto da Esperança.
nomes sonoros que são
a fantasia do povo,
até sua remissão.
(CASTRO, 2004, p. 49)

REFERENCIAS

CASTRO, Ney Leandro de. Romance da cidade de Natal. Natal: Sebo Vermelho, 2004.
FERREIRA, Ângela Lúcia. . .[ et al.]. Uma cidade sã e bela: a trajetória do saneamento de Natal - 1850 a 1969. Natal: IAB/RN; CREA/RN, 2008.
LIMA, Pedro de. Natal século XX: do urbanismo ao planejamento urbano. Natal: EDUFRN, 2001.
NATAL. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo. Ordenamento urbano de Natal: do Plano Polidrelli ao Plano Diretor 2007. Natal: Departamento de Informação, Pesquisa e Estatística, 2007.


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