Celso Paiva Martins
Aqui cheguei em 1933, com 13 anos de
idade. Cresci e envelheci naquele pedacinho da Rua Silva Jardim ao Beco da
Quarentena, hoje apelidado de Largo da Rua Chile. Sempre ouvi dos meus
ancestrais que a Ribeira foi o marco inicial do comércio de Natal. A Ribeira
era privilegiada com o porto e dois terminais de passageiros que trafegavam de
trem. Constantemente, aportavam navios de cargas ou de passageiros em trânsito
para o Norte ou para o Sul, e isto concorria muito para aumentar a movimentação
do bairro. Também era na velha Ribeira onde estavam instalados os escritórios
das companhias de aviação, tais como a Air France, Condor e Panair, que ficavam
nas intermediações da Rua Frei Miguelinho com a Rua Tavares de Lyra.
O bairro também abrigava os melhores hotéis da época.
Hotel Internacional, Hotel dos Leões, Hotel avenida e outros de categoria mais
inferior, que tinham muita procura pelos comerciantes do interior e isto se
completava pela proliferação das casas noturnas. A Ribeira dos anos 1930
centralizava todos os segmentos do comércio, quer de modas quer de exportação.
Era ponto também de embarque e desembarque de transportes ferroviários e
fluviais.
O comércio era assim distribuído:
a)
Rua Doutor Barata: - Intercessão com a Rua Quintino Bocaiúva e a Praça
Augusto Severo. Neste trecho ficava todo o comércio de modas de Natal. Não
existia a semana inglesa, o movimento maior se registrava sempre aos sábados,
quando as senhoras da classe A desfilavam elegantemente na Ribeira, rua acima,
rua abaixo, portando belos vestidos, luvas e chapéus. E para aperfeiçoar a
beleza das elegantes da época, existia o armarinho Santa Terezinha, de
propriedade de D. Letícia Cerqueira, sogra do Dr. Jessé Café. O comércio de ferragens
estava praticamente centralizado numa só loja, a C. Galvão & Cia.,
pertencente à família Galvão, que após uma crise na administração, acompanhada
do falecimento do Cel. Clemente Galvão, principal titular, se se deparou. O
conhecido Galvãozinho trouxe em sua companhia o Sr. Amaro Mesquita, que era um
conceituado viajante da época, e juntos formaram a firma Galvão Mesquita, que é
com certeza a única que permanece desde os anos 1932, porque Limarujo veio se
instalar muito tempo depois. Existia também a firma Gurgel Luch, de propriedade
alemã, constituída por agentes das companhias de navegação alemãs que por aqui
aportavam para o recebimento de toneladas e mais toneladas de produtos
regionais, tais como algodão, cera de carnaúba, couros, peles, farinha de mandioca
e até mesmo o açúcar mascavo.
b)
Na Rua do Comércio, hoje Rua Chile, intercessão com a Rua Aureliano
Medeiros, estava centralizado todo o comércio exportador, além dos armazéns com
vendas a grosso de cereais, açúcar e outros produtos correlatos, que aqui eram
disputados semanalmente pelos comerciantes do interior, não somente de nosso
Estado, como também dos estados vizinhos. Existia na época a chamada “Despensa
natalense”, ou Casa Machado, que mantinha grande estoque de finos produtos
nacionais e estrangeiros, envolvendo bebidas das mais requintadas da época e
muito bem aparelhada para o atendimento a navios tanto de bandeira nacional
quanto internacional, como também atendia as companhias de outras praças como
Fortaleza e Recife. Ainda registro na memória a Wharton Pedrosa S.A, que era
uma firma inglesa e que teve como sócio o pai do Dr. Sílvio Pedrosa,
considerada a maior exportadora de algodão do nosso Estado; a Lafayete Lucena,
que foi adquirida por Dinarte Mariz; a Fernandes & Cia., uma associada da
firma mais antiga do Estado; a Tertuliano Fernandes (Mossoró) e também a M.F.
do Monte, depois Monte Rebouças Ltda. Esta não exportava somente algodão, como
também o caroço do algodão, cera de carnaúba, borracha de maniçoba, entre
outros. Estava também localizada na Rua Chile as instalações da firma Martins,
Irmão & Cia., que comprava produtos regionais desde o couro do sapo ao
açúcar mascavo, existindo até hoje, embora com a espinhela caída, com razão
social de Mercantil Martins Irmão S/A, modificação esta feita por força da
transformação em S/A no ano de 1965. Afora os exportadores já citados que se
instalaram neste trecho de Natal, existia também o comércio grossista de
tecidos, de João Galvão Filho, David Cunha e Alves de Brito S/A; na parte de
estivas recordo-me de L. Barbosa & Cia. Ltda. e Cunha, Maia & Cia.
Entre as representações se destacava a Gurgel, Amaral & Cia., pois além de
trabalhar com boas representações, mantinha por conta própria um grande estoque
de material para o campo que variava desde o balde para leite a mais
sofisticada campinadeira. Era formada por três irmãos: Salviano Gurgel , Manoel
Gurgel e um terceiro, que a herdaram do pai. Outra firma que se destacava em
representações era a Mesquita & Cia. Ltda., que por conta própria mantinha
agenciamento à Cia. de Navegação Pereira Carneiro, atualmente Cia. Comércio e
Navegação. Não alcancei funcionando, mas me lembro das instalações da firma dos
Tinocos, inclusive o Sr. José Tinoco, sócio do Sr. Enico Monteiro, que na época
comercializava peles e algodão.
c)
Avenida Tavares de Lyra: – Conhecida como o centro das confabulações
políticas da época, muito frequentada pelos políticos e empresários
considerados de elite, que formavam o Partido Popular Brasileiro. Foi
exatamente neste trecho de Natal, até 1935, que conheci o carnaval, depois
passando para a Cidade Alta. Existiam também as firmas que vendiam automóveis e
acessórios importados. Ainda gravo na memória a M. Martins & Cia., Severino
Alves Bila, Santos & Cia. Ltda. (já nos anos 1940). A única agência de
banco, com exceção do Banco de Natal (antigo Bandern), era a agência do Banco
do Brasil localizada na esquina com a Quintino Bocaiúva e Tavares de Lyra.
d)
Rua Frei Miguelinho: – Outrora totalmente residencial, aqui, acolá, via se
uma bodeguinha, a qual existia em função das proximidades do Mercado da
Tatajuba. A expansão do comércio nesta rua deve-se muito ao meu tio, o saudoso
Vicente Martins, um desbravador desta rua. Onde hoje se localiza uma repartição
da Prefeitura, que era de propriedade do Sr. Otacílio Maia, funcionava a Cia.
de Navegação Conteira, que posteriormente foi alugada à firma João Câmara, que
já possuía um depósito na Rua Chile (deixei de mencionar quando escrevi sobre a
Rua Chile acima, porque este depósito era utilizado somente para o recebimento
de mercadorias vindas das filiais do interior). Apesar de ter sido um grande
empresário no setor das exportações, João Câmara somente veio a ser reconhecido
após a guerra, falecendo poucos anos depois. Possuía boas fatias das
exportações, porém era audacioso e um autêntico ditador, pois sempre teve como
meta acabar com qualquer concorrente de médio porte. Onde ele descobria que
tinha um cliente dele querendo se tornar independente, com a força política que
possuía, mandava arrochar, e a única saída era o camarada vender o
estabelecimento a ele ou encerrar as atividades antes que ficasse na pior. Eu
não tenho lembrança que exista gente por aí se considerando rico ou mesmo
Colégio Pedro II (onde o escriba deu os seus primeiros passos), a Escola Normal
e a Escola Doméstica. Quem mais contribuiu para a desativação da velha Ribeira
foi o fechamento da Estação Rodoviária, porque nela embarcavam e desembarcavam
os pequenos comerciantes que vinham do interior para comprar ali mesmo na
Ribeira. Apesar desta velha Ribeira ter
sido considerada o centro nevrálgico de toda a atividade comercial econômica, social
cultural e política nos anos 1930, só veio melhorar um pouquinho de 1935 para
cá, com a construção de edifícios, destacando-se o Grande Hotel (1935),
Edifício do Bandern (1939), Edifício S. Bila (1940), Associação Comercial
(1942), Ed. Fernando Costa Agricultura (1943), Edifício Mirmão (1959), Edifício
Quinho Chaves (1954), Banco da Lavoura (1968) e o Banco do Brasil (1968). Meios
de Comunicação – Era difícil a comunicação para fora do Estado e na capital só
existia a Rádio Educadora, fundada por alguns empresários locais entusiastas
destas coisas. Tivemos bons serviços de alto-falantes, de propriedade do Sr. Romão,
estabelecido em uma casa de revistas e jornais e poucos livros. Ele tinha sido gazeteiro
no Recife. Ainda podemos citar a inglesa Western Telegraf Co. (1942), a Rádio
Internacional – Radional (1948) e o Serviço de Telefonia Automática, instalado
pela Cia. Força do Nordeste, dos ingleses, em 1943. Remediado que tenha
recebido ajuda de João Câmara, muito pelo contrário, pois se formos analisar
direitinho ele não dava a menor chance, nem mesmo para aqueles que derramaram o
suor pela empresa.
e)
Avenida Sachet, (hoje Duque de Caxias): - Ali não existia comércio a não
ser o posto de Antonio Farache, um cartório, o Hotel Avenida e a Recebedoria de
Rendas. A avenida era praticamente tomada por residências de classe A,
inclusive a mansão do Dr. Januário Cicco, Odilon Garcia, etc. Nos anos 1940, o
Sr. Francisco Varela (Chico Varela) construiu o edifício Campielo, que foi
ocupado pelo Banco do Brasil por um longo período. Onde hoje está localizado o Banco
do Brasil era a residência do Sr. Anaximandro, um tradicional comerciante. Na Rua
Ferreira Chaves existia uma parte para o comércio e outra parte para residências,
além da delegacia e da chamada chefatura de polícia. O ramo de comércio ali existente
se estendia por toda a Rua do Triunpho (hoje denominada 15 de Novembro),
abrangendo a Rua Almino Afonso e as adjacências.
f)
Praça Augusto Severo: - Como toda a cidade que tem o seu cartão postal, o
de Natal era exatamente a Ribeira, com predominância para a praça Augusto
Severo, que era conservada, arborizada e, à noite, recebia, vindas da Cidade
Alta, as moças que ali faziam o Footinf. A Ribeira tinha o privilégio de
possuir duas estações ferroviárias, uma conhecida como a Central, que explorava
o transporte ferroviário no Rio Grande do Norte, e a outra era a Great Western,
dos ingleses, entre Natal e Recife, conduzindo os mais sofisticados passageiros
e escoando produtos de Pernambuco para o comércio local. Teve a Ribeira os
melhores estabelecimentos de ensino da época, como o Colégio Pedro II (onde o
escriba deu os seus primeiros passos), a Escola Normal e a Escola Doméstica. Quem
mais contribuiu para a desativação da velha Ribeira foi o fechamento da Estação
Rodoviária, porque nela embarcavam e desembarcavam os pequenos comerciantes que
vinham do interior para comprar ali mesmo na Ribeira. Apesar desta velha
Ribeira ter sido considerada o centro nevrálgico de toda a atividade comercial
econômica, social cultural e política nos anos 1930, só veio melhorar um
pouquinho de 1935 para cá, com a construção de edifícios, destacando-se o
Grande Hotel (1935), Edifício do Bandern (1939), Edifício S. Bila (1940), Associação
Comercial (1942), Ed. Fernando Costa Agricultura (1943), Edifício Mirmão
(1959), Edifício Quinho Chaves (1954), Banco da Lavoura (1968) e o Banco do
Brasil (1968). Meios de Comunicação – Era difícil a comunicação para fora do
Estado e na capital só existia a Rádio Educadora, fundada por alguns
empresários locais entusiastas destas coisas. Tivemos bons serviços de
alto-falantes, de propriedade do Sr. Romão, estabelecido em uma casa de
revistas e jornais e poucos livros. Ele tinha sido gazeteiro no Recife. Ainda
podemos citar a inglesa Western Telegraf Co. (1942), a Rádio Internacional – Radional
(1948) e o Serviço de Telefonia Automática, instalado pela Cia. Força do
Nordeste, dos ingleses, em 1943.
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