Por Flávio Rezende*
Peço licença a meus leitores para tecer algumas considerações e explicar
algumas decisões que andei tomando nos últimos dias.
Já é do conhecimento público que em meados de novembro/dezembro a Casa do Bem
encerrará suas atividades humanitárias e, os trabalhos sociais conquistados e
executados com muito amor, devem continuar sob a égide do Conselho Comunitário
de Mãe Luiza e Aparecida.
Para chegar a este momento vamos retroceder ao tempo de minha juventude, fim
dos anos 70, totalidade dos 80 e começo dos 90. Neste tempo não havia entre os
jovens envolvimentos mais relevantes relacionados a ajudas ao semelhante,
questão dos animais e do meio ambiente e, circulávamos entre festinhas
diversas, romances, futebol e muito pouco nos relacionávamos com política.
Apesar de tudo isso, desde cedo, gostava de ajudar as pessoas que batiam na
porta lá de casa e, fazia amizades com carentes, causando até comentários e
algumas pequenas complicações, já contornadas e que viraram história.
O tempo passou, comecei a trabalhar muito jovem, me meti em diversas atividades
e fui juntando dinheiro até que decidi comprar um terreno e levantar minha
casa. Num episódio que por si só merece um artigo inteiro, decidi comprar este
terreno em Mãe Luiza, causando espanto na família e entre amigos.
Apesar de tudo levantei o lar e morando lá comecei a caminhar pela comunidade,
conhecendo pessoas e seus problemas e, fui ajudando uma família aqui,
melhorando um banheiro ali, levando para hospitais pois não tinha Samu, para
ter filhos, até que depois de muitas ajudas pontuais, comecei a ajudar projetos
já existentes e, em minha própria casa, fiz uma escola de balé, a piscina era
coletiva, fundamos uma escolinha de futebol e as coisas foram aumentando,
aumentando e, quando percebi, minha casa era a própria Casa do Bem de tantas
coisas que já aconteciam lá.
Aconselhado pelo amigo Paulo Campos decidi comprar uma casa e deslocar para a
mesma todo o movimento que já ocorria naturalmente na minha, onde chegava a
receber diariamente mais de 20 pessoas com problemas pessoais, de emprego,
saúde e onde buscava com meus próprios recursos e conhecimentos, minorar
aflições e conseguir colocações no mercado de trabalho, entre diversas outras
ações do bem.
Diante da necessidade de ter um novo espaço, fui igualmente aconselhado a abrir
uma ONG para receber recursos para a compra desta casa. Assim foi fundada em
agosto de 2005 a Casa do Bem. A luta para comprar a casa foi radicalmente
mudada quando o empresário Ricardo Barros doou um terreno, vizinho onde morava
e, através da Lei Câmara Cascudo, obtive apoio da Petrobras e da Cosern e
construímos a sede própria da Casa do Bem, inaugurada em julho de 2010.
De lá para cá os voluntários foram chegando e as ações acontecendo, nunca
havendo interrupção e a Casa do Bem funcionando, prestando relevantes serviços,
contando para seu funcionamento com depósitos financeiros de pessoas físicas e
de empresas, mas sempre com somatório apertado para as reais necessidades que
se apresentavam a cada dia.
A dificuldade foi amenizada com assinatura de um convênio na administração de
Micarla de Sousa, que possibilitava o pagamento de despesas básicas, livrando
um pouco a conta principal do total dos gastos.
O convênio foi renovado através de Carlos Eduardo, mas, ano passado, uma greve
no órgão que analisa as prestações de contas do município atrasou tudo no meio
do ano e a Casa do Bem e outras entidades ficaram sem o benefício do convênio o
resto do ano.
Depois de reuniões onde as decisões do setor jurídico iam mudando, decidimos
esquecer 2013 e renovar para 2014, mas, infelizmente, chegamos em julho e o
convênio não foi assinado.
Sem o convênio a Casa do Bem foi entrando na conta normal e a fragilizando ao
ponto de ter que realizar, praticamente todos os dias, campanhas através das
mídias sociais e de outras formas, não obtendo êxito, com poucas pessoas
depositando algo e na maioria das vezes, depósitos apenas naquele momento em
que demonstrava desespero pela situação.
Esse apertado existir financeiro, aliado as muitas decisões que tenho que tomar
diariamente, relatórios a preencher de conselhos diversos, pegar pessoalmente
doações em lugares distantes, enfim, muitas e muitas atividades, solicitações
diversas de mil coisas para os projetos, literalmente me fragilizaram e me
levaram a decisão de extinguir a Casa do Bem e continuar meu trabalho social
sem o peso de dirigir uma ONG com tantas necessidades e apoio financeiro
insuficiente.
Não critico ninguém pelo ocorrido, podia ter tido a competência de tornar a
Casa do Bem viável através de editais e outros convênios, mas confesso que
tentei de tudo que se possa imaginar, mas não aconteceu comigo. O Cidadão Nota
10, antes uma esperança das ONGs praticamente não funciona, os convênios são
difíceis de conseguir e de operar, uma vez que a legislação trata igualmente
coisas de centavos e de bilhões e os editais nunca conseguimos material humano
para nos inscrever a tempo em suas nuances burocráticas.
Só as pessoas próximas sabem o tempo que dediquei a muitas
coisas, o dinheiro próprio que gastei no início e durante todo este tempo,
atendendo com recursos meus inúmeros pedidos que a Casa do Bem não deveria se
meter, além de ter que aguentar com resignação confissões de amigos dizendo que
algumas pessoas acham que desviava recursos para viajar, como se eu não tivesse
condições de fazer tudo que faço com meus próprios rendimentos, posto que sou
funcionário de nível superior da UFRN, concursado, com especialização em
Ciências da Religião e mestrado em andamento em Estudos da Mídia, com
passagens por televisões, jornais, incursões no comércio e na construção civil,
com vários apartamentos populares construídos, torre de telefonia num terreno
meu, enfim ganho mais que deputados, vereadores, só não consigo ter o padrão de
vida que muitos tem e nem apresentar na declaração anual do Imposto do Renda os
bens que os mesmos usufruem e a incrível e ascendente curva patrimonial.
Apesar de me considerar muito bem sucedido financeiramente
meu carro é um Sandero, o de minha esposa um Clio, moro num apto de 52 metros
quadrados e minha esposa numa casa herdada da mãe. Nossos filhos estudam em
colégios simples, um inclusive com bolsa e, quando viajamos, buscamos sempre os
pacotes ofertados pelos sites de busca e nos hospedamos na casa de amigos e
parentes ou em hotéis de classificação mediana.
Encerro então um ciclo de ativismo social como dirigente de
ONG de maneira honesta, com toda a contabilidade da Casa do Bem exposta no link
– prestação de contas, no site www.casadobem.org.br, acreditando ter feito um monte de
bondades, nunca pedindo um voto sequer a seu ninguém, não colocando o fator
religioso na ordem do dia e nem permitindo remuneração para nenhum dirigente da
entidade.
Os trabalhos sociais vão continuar com o Conselho
Comunitário, estarei por perto ajudando, devo permanecer junto com amigos com a
Escolinha de Futebol que permanecerá com o nome Casa do Bem, mas sem o peso de
uma entidade devidamente regularizada, vou levar a escolinha como antes,
informalmente.
Todos que ajudam a Casa do Bem podem continuar até dezembro
e caso desejem, repassarei contatos e conta do Conselho Comunitário para
continuidade dos projetos desenvolvidos, quanto a escolinha vou buscar apoios
para tocar o barco com 250 jovens em várias categorias.
Gratidão aos que estão ajudando e aos que elogiam e dizem
coisas bonitas. Gratidão principalmente aos valorosos e queridos voluntários
que tornaram tudo possível e que devem continuar fazendo o bem sem olhar a
quem. Sem eles nada seria possível e fui apenas o mentor e o buscador de
apoios, eles é que dão as aulas, cuidam do cotidiano e suam de maneira heroica
e verdadeira.
Quaisquer dúvidas passem e-mail para escritorflaviorezende@gmail.com,
meu envolvimento com o ativismo social apenas chega a uma nova fase, continuo
com boa vontade para ajudar, só adequarei o fardo a minha capacidade de
suportar o peso, vamos que vamos, luz e paz.
· É
escritor, jornalista e ativista social em Natal/RN (escritorflaviorezende@gmail.com)
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