Por Flávio Rezende*
Sempre que viajamos buscamos pelos sentidos, assimilar o máximo
possível todas as nuances do novo lugar. A possibilidade de sair de sua toca e
estar, mesmo que temporariamente, na toca e na oca dos outros, é um momento
ímpar de adentrar em novas formas arquitetônicas, climas, comidas e,
principalmente, saber como aquele povo vive e pensa.
Já tive a oportunidade de viajar muito, conheci lugares
radicalmente diferentes de nossa Natal e do amado Brasil, como a Índia, Nepal e
o Peru. Todos os lugares provocam reflexões, mas a viagem recente que fiz para
Cuba, foi a mais provocativa em termos pensamentais.
Cuba está parada em termos físicos há 50 anos. Tudo lá é velho, os
prédios, os carros e as ideias do poder central. Só os turistas desfrutam de
internet, canais de TV e comida variada. Em Havana só tem uma FM, a 104.7 com
transmissão estatal, o mesmo ocorrendo com as TVs que eles assistem, limitadas
e do governo ou da Venezuela.
Nos deslocamentos que fazemos, eles nos pedem sabonetes e livros.
Conversando com alguns, falam abertamente que preferem que haja abertura
política. Poucos, geralmente os mais velhos, defendem a “revolución”.
Indo aos fracos supermercados, que mais parecem cantinas daqui,
notamos a falta de oferta de produtos, resultado, segundo alguns, do embargo
econômico imposto pelos Estados Unidos em 7 de fevereiro de 1962.
Cuba parece um cenário dos anos 50 e 60 com casas e prédios
daquela época, carros igualmente antigos circulando e um povo educado e gentil.
Esse é o lado bom da coisa toda. Com raríssimas exceções, ninguém
pede nada, apenas oferecem alternativa da compra de charutos nas ruas. Não vi
nenhuma criança pedindo absolutamente nada. Como tem poucos carros, não existe
engarrafamento, o trânsito flui a qualquer hora e em qualquer lugar.
Como sou vegetariano não posso falar sobre a comida local, mas,
não vi nada muito diferente daqui, até pelo fato de que no resto do mundo, tudo
está globalizado, tendo de tudo um pouco em todo canto que não seja como Cuba
ou alguns outros poucos lugares ainda fechados do planeta.
A informação que eles dispõem de saúde e educação gratuita
procede. Não existem analfabetos e o atendimento médico é free, mas, nem toda
prescrição medicamentosa é gratuita. Apesar disso, os médicos e professores
preferem largar seus empregos e buscar sombra em atividades relacionadas ao
turismo, para que possam ganhar gorjetas, hoje o grande sonho dos cubanos, em
função dos baixos salários pagos pelo governo.
A grande fonte de renda do governo é o turismo, eles taxam o dólar
fortemente e quase todas as moedas ficam fracas lá, proporcionando grandes
arrecadações e injetando muito dinheiro na economia, dai a correria de todos
para atividades com ligações turísticas.
Escrever sobre um tema tão complexo num limitado artigo é sempre
temerário, a discussão dos pros e dos contras exige livros e livros, várias
questões se apresentam numa hora dessas, mas, quem vai até Cuba e conversa com
as pessoas sente que está na hora da abertura.
Lá a criminalidade é quase zero, andamos a qualquer hora e em
qualquer lugar tranquilos, não sofremos assédio, as pessoas são atendidas pelo
governo em alguns pontos importantes, mas, não ser livre para expressar opinião
política e poder desfrutar das inovações tecnológicas do mundo moderno, são
pontos que, pessoalmente, não acho certo.
Acredito que dá para ter um meio termo, mantendo conquistas
importantes da “revolución” com as facilidades e os prazeres da modernidade,
tornando a vida mais feliz em todos os aspectos.
Fico torcendo para que os sucessores dos irmãos Castro, direcionem
Cuba para este caminho e, de minha parte, volto feliz com a lembrança dos bons
papos, dos sorrisos, da noitada no Buena Vista Social Club, da boa turma de
espíritas natalenses que me fizeram companhia (fomos ao 7º Congresso Espírita
Mundial), da bela praia em Varadero, dos deslocamentos nos coco taxis e de ter
estado num lugar que apesar da pouca liberdade, preserva em sua história e em
sua memória, o DNA do povo feliz que canta e dança cha-cha-chá, mambo,
merengue, pachanga, rumba e salsa.
Hasta la vista Cuba, pretendo voltar.
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