12 de fevereiro de 2015

O atrapalhado velho Cosme e suas cercas de varas sertanejas



 Por João Bosco de Araújo
     Seu Cosme era um agricultor do sertão de Caicó. Seu ofício era fazer cercas de madeira, entrançando as varas de marmeleiros, sua maior habilidade e procura pelos proprietários de terras da região. Mas era no inverno que o velho Cosme abandonava as feituras das cercas para se dedicar à agricultura, literalmente. Aliás, na ausência de chuvas, a cerca era a única saída para manter a sobrevivência da família, que era bastante numerada e, cada vez, aumentava netos e bisnetos.
     O ano muito bom de inverno, início de 1964, meu pai Pedro Salviano do Umbuzeiro ajuntou uma cabroeira de trabalhadores para a plantação de arroz e outros grãos. Seu Cosme estava incluindo para a jornada de trabalho. Agrupados, meu pai lançava uma corda, organizada com laços, para a medição das covas aonde seriam inseridas as sementes do plantio.
      Com cerca de 20 metros de comprimento, a meta da corda era ser içada para a frente e o trabalho seqüenciado, com os agricultores avançando e cavando o chão molhado pelo bom inverno.
     “À frente”, gritava Pedro Salviano. E para sua ira, Seu Cosme recuava. E a cena se repetia. Todos avançavam, Seu Cosme recuava. “Ô diachos”, praguejava. O dia calejado, sol a pino, escaldante. Meu pai olhava aos céus, resmungava. Após um descanso, voltava ao grupo e debaixo de seu chapéu de couro ordenava: “Seu Cosme, preste bem atenção, quando eu disser pra frente o senhor avança com os outros, entendeu?” Desconsertado, ele acenava com a cabeça, positivamente.
       Não se cumpria o ensinamento da tarefa e o atrapalhado Cosme voltava a recuar, em vez de ir pra frente. Foi nesse ínterim que outro trabalhador, José Jerônimo, mais conhecido como Zé Girósme, já sem paciência, pediu para intervir: “Seu Pedro”, disse ele, lá de trás, “vamos combinar e o senhor em vez de gritar pra frente, diga pra trás!”
        Foi a solução e o trabalho realizado com sucesso. Melhor foi a safra com muita fartura no bom ano de inverno no sertão do Seridó.
          Lembrei-me desse episódio por causa de uma postagem na página da internet do conterrâneo seridoense Geraldo Anízio, que ele descreve assim:
 CURRAL COM VARAS DE MARMELEIRO
 Ó SERTÃO... Ó SERIDÓ!!!
      No Seridó, por vezes, há de se avistar alguns desses currais feitos de varas de marmeleiro bem comum na caatinga  nordestina. As cercas ficam mais resistentes à chuva e ao sol de tinir. O sertanejo só disponibiliza o trabalho dele em cavar a terra, aprumar os caibros e depois fazer o entrançamento das varas verdes do marmeleiro formando o cercado. Sem muito gasto de dinheiro, o seridoense usa dos recursos da terra e do que o sítio pode oferecer para a segurança da criação de ovelhas, bodes e o gado.
 Quando perto  da casa, a cerca de marmeleiro tem a serventia de quaradouro e varal para enxugar as roupas lavadas em casa ou no açude quando é próximo. As cercas de marmeleiro, de pedras as de aveloz ainda se veem pelos sítios regionais principalmente no Seridó do Rio Grande do Norte.
©2015 www.AssessoRN.com | Jornalista Bosco Araújo -  Twitter @AssessoRN
Foto: Arysson Soares em seu Facebook


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