E o rio chegou! Dizendo assim, parece que o rio não existia naquele
lugar, ou mesmo, não se encontrava ali, naquele momento; e então torna-se
difícil entender a expressão: “ a chegada do rio”.
O certo é que, há a realidade das chegadas dos
rios no sertão nordestino; e esta foi uma visão belíssima e impressionante,
causada pelas chuvas de início de inverno, que eu tive a felicidade de
presenciar.
Morando numa cidade do interior nordestino –
Caraúbas -, eu estava acostumada a ver na época de inverno, chuvas fortes com
relâmpagos (vindos de todos os lados) e trovões, cujos ruídos estalantes e
depois estrondosos espalhavam medo e preocupação a toda população
caraubense. Vez ou outra caiam raios
pela cidade, ignorando os famosos “apara-raios”, instalados e distribuídos em
vários locais da cidade. Certa vez, um desses raios atingiu uma casa na cidade,
atravessando a parede e derrubando, com o impacto, o cidadão morador daquela
residência. Felizmente ficou apenas o
susto.Vários outros casos semelhantes aconteceram, sem maiores conseqüências.
Mas, vamos à chegada do rio.
Tudo aconteceu numa época em que fui morar na fazenda
de um tio, chamada “Quixaba”. “Quixaba” já foi o título de um artigo que
escrevi, nesse jornal, publicado no mês de março de 2006.
Tinha começado o inverno; por sinal um bom inverno
naquele ano. Mas os rios e os açudes ainda continuavam secos, ou quase secos,
como sempre acontece no período de estiada no sertão. As árvores permaneciam
com o seu tom verde, mas de um verde amarelado, embora tivéssemos a esperança
de que logo, logo, voltaria a sua cor definitiva. O pasto para alimentação dos
animais já não existia e os mesmos tinham que ser alimentados com ração
comprada, o que prejudicava bastante a
situação financeira dos fazendeiros. A água, também escassa, não era suficiente
para atender o bebedouro dos animais, sendo necessário preparar cacimbas (escavação
feita em leitos secos de rio que se acumula alguma água), ou mesmo furar poços
para atender a necessidade de gente e animais.
E o rio chegou!
A tarde estava bonita, “bonita para chover”,
expressão usada no interior, quando se aproxima a chuva. As nuvens já
escurecidas ao nascente mostravam o tempo chuvoso que ia desabar. Mas a chuva
não caia na fazenda. O fazendeiro e aquele povo humilde que compunha seus
moradores, conhecedores das coisas do sertão, falavam: “a chuva é p’ras bandas
das cabeceiras do rio e o mesmo irá encher de qualquer jeito e levará água para
o açude”. E o alvoroço! Todos queriam
ver de perto aquele fenômeno, principalmente aqueles que, como eu, ainda não
tinham presenciado a tal chegada do rio. E lá fomos nós para as margens do rio
próximo à fazenda.
E eu pensava: como este rio vai encher se a chuva
não tinha caído? Como pode ser isso possível?
De repente aquele barulho enorme; chiados,
estrondos, estalos de galhos secos e a correria. Era ele sim; era o rio que
vinha chegando trazendo consigo tudo o que encontrava no caminho: galhos,
areias, pedras, cobras, matos, etc.; ele se aproximava e ia preenchendo toda aquela extensão, parecendo uma cobra
gigantesca, se arrastando de um lado para outro, como se estivesse à procura de
um lugar apropriado para se esconder e fazer a sua morada.
Todos , ali presentes, iam acompanhando, em suas
margens, o circuito do rio. Eu também, mas um pouco distante, pois tinha receio
que, de repente, ele se estendesse pelas laterais e me carregasse junto com
ele. A alegria era enorme e contagiava a todos. O rio corria em direção ao
açude da fazenda e este, com certeza, estaria de braços abertos para recebê-lo.
Foi um quadro lindo, fantástico e emocionante.
Senti a presença de Deus naquele momento; era uma das suas obras grandiosas
acontecendo. Agradeci a Ele a felicidade de poder presenciar tão belo e
perfeito espetáculo da natureza.
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