Homero de Oliveira Costa, prof. Departamento de Ciências Sociais
da UFRN.
Em julho de 2013, o governo, como “resposta” às
manifestações de junho encaminhou à Câmara dos Deputados um
documento sugerindo a convocação de um plebiscito para que a
população fosse consultada sobre cinco pontos de uma possível
reforma política: Sistema eleitoral (distrital; distrital-misto e
proporcional), financiamento de campanhas (público, privado ou
misto), fim da suplência de senador, coligações partidárias (fim
das coligações em eleições proporcionais) e fim do voto secreto
no parlamento.
Desde o início estava claro para os que têm
acompanhado o trâmite da reforma política no Congresso Nacional,
que não haveria plebiscito nenhum, pelo menos se dependesse dele e
que valesse para as eleições de 2014. Nem mesmo os partidos da
chamada “base aliada” aprovaram. Apenas o PT, PDT e PC do B
apostaram (e perderam) na realização do plebiscito.
Pouco depois da apresentação da proposta do
governo, foi formado um Grupo de Trabalho na Câmara dos Deputados,
com 14 integrantes, coordenado pelo deputado Cândido Vacarezza,
(PT/SP) e com prazo de 90 dias para apresentar uma proposta de
reforma política. Na primeira reunião do grupo, o coordenador foi
claro: as mudanças não valeriam para as eleições de 2014. A
própria formação de um grupo já mostrava que não havia intenção
de fazer reforma política: propostas já existem e há muito tempo
no Congresso Nacional, tanto do Senado, como da Câmara dos Deputados
com suas Comissões Especiais de Reforma Politicas e os respectivos
relatórios finais.
No dia 16 de outubro de 2013, o plenário da
Câmara dos Deputados aprovou, por 222 votos contra 161 e
uma abstenção, um projeto chamado apropriadamente
de “minirreforma eleitoral” (PL 6397/13). O
Projeto teve origem no Senado e foi encaminhado à Câmara dos
Deputados. Substancialmente, como veremos, não altera em
nada o sistema político brasileiro e traz apenas mudanças
superficiais e “cosméticas”
como, entre outros exemplos, a proibição de
pintura de muros particulares pelos candidatos. O PL mantém o
financiamento privado das campanhas, altera as normas para
propaganda eleitoral na TV e na internet (permite a
pré-campanha na internet e nos demais meios de comunicação,
podendo os filiados a partidos políticos ou de
pré-candidatos participar de entrevistas,
programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na
internet, com exposição de plataformas e projetos políticos)
e entre as mais polêmicas, por suas óbvias
consequências, limita o poder de auditoria da Justiça
Eleitoral sobre a contabilidade, a prestação de contas e
as despesas dos partidos. Com a justificativa de que isso simplifica
a prestação de contas dos partidos, a justiça deverá fazer apenas
o exame formal dos documentos contábeis e fiscais que forem
apresentados pelos partidos políticos. Fica claro, portanto a
intenção de limitar o poder de auditoria da Justiça
Eleitoral sobre a contabilidade, a prestação de contas e as
despesas de campanha eleitoral dos partidos.
Pouco depois, mais precisamente no dia 22 de
outubro a Câmara conclui o PL a ser encaminhado de volta ao
Senado. O PL ainda foi “flexibilizado” e inclui a rejeição da
proposta do Senado de liberação de
doações de concessionários de serviços públicos caso eles não
sejam "os responsáveis diretos pela doação". Também foi
aprovada a ampliação dos recursos do fundo
partidário para campanha e a permissão para que, no
semestre das eleições, possam ser feitas transferências
do fundo partidário aos partidos que tiveram suas
contas desaprovadas pela Justiça Eleitoral. Entre as medidas
“cosméticas” fica proibido o uso de bonecos
nas campanhas e ainda placas, faixas, outdoors, cartazes,
bandeiras e pinturas em muro de bens particulares (com
multas previstas de R$ 5.000,00 e R$ 15.000,00). Ficou
mantida também a proposta do PL do Senado de proibir
propagandas que ridicularizem candidato, partido ou coligação.
Outra alteração incluída na proposta da
Câmara foi a que permite que o político que receba punição
da Justiça Eleitoral possa pagar a multa em até 60 vezes
“desde que cada parcela não ultrapasse o limite
de 10% de seus rendimentos”. Também fica autorizado que
os comícios das campanhas podem ser realizados até às 2h
(hoje eles têm que ser encerrados às 24h).
Jânio de Freitas em artigo muito anterior a
essas propostas, mas já prevendo o que ocorreria no Congresso,
afirmou que “o essencial está fora”. E, de fato, observada às
propostas apresentadas pela Câmara ao PL do Senado, questões
essenciais ficaram de fora, inclusive várias propostas da Comissão
Especial de Reforma Política do próprio Senado, assim como da
Câmara dos Deputados (a mais recente teve como relator o deputado
Henrique Fontana (PT/RS).
Entre questões importantes que Jânio de Freitas
chamou à atenção, estão a que ele chamou de “arrastão” e a
outra relativa às doações empresariais. Ambas, fora da
minirreforma eleitoral. Em relação ao “arrastão” a referência
são as muitas distorções do sistema eleitoral, entre outras, a que
permite que uma alta quantidade de votos de um candidato completa a
votação insuficiente de outros (houve casos de deputados eleitos
com apenas 200 votos, beneficiado por uma coligação que teve à
frente um "puxador de votos") distorções, claro, que
também ocorrem nas Câmaras Municipais, ou seja, em função da
coligações, pode-se eleger candidatos (inclusive de partidos que o
eleitor não vota) com menos votos do que outros que não foram
eleitos, tornando assim ilegítima a representação parlamentar. No
caso da Câmara dos deputados, para exemplificar, apenas 36
deputados foram eleitos em 2010 com votação própria. Os demais se
beneficiaram das "sobras" de votos nos respectivos partidos
ou de coligações com outros partidos. Portanto, sem haver
proibição das coligações, as distorções continuarão. Para ele:
“As coligações para absorção de um tempinho a mais na
propaganda eleitoral dita gratuita, em TV e rádio, resultam em
corrupção maior a cada eleição. Tornaram-se comuns as coligações
para que dirigentes de partidos pequenos vendam o tempo de propaganda
que caberia à sua sigla”.
Quanto às doações empresariais -
grande fonte de corrupção - são usadas “para
encobrir identidades e com isso, dificultar possíveis
comprometimentos e responsabilizações legais de
doadores-compradores. O financiamento das campanhas (...)
precisa ser claro e objeto de fiscalização rigorosa em mão dupla:
da Justiça Eleitoral, na contabilidade do candidato ou partido, e da
Receita Federal na parte doadora. Toda obscuridade eleitoral
deslegitima o processo democrático e amplia a corrupção”
-.
Há muitas outras propostas relevantes que ficaram
de fora. Como disse Jânio de Freitas: “Reforma política
que não contribui para a moralização e a representação legítima
não é reforma. Com sorte, não é apenas embuste”. É o
que temos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário