Teatro Alberto Maranhão
Anchieta Fernandes
Embora
o século passado (século 20) tenha
recebido impactos influenciadores de outros segmentos culturais, nenhum destes
segmentos conseguiu superar a influência do cinema. A chamada Sétima Arte nos
deu a chance maior de conscientização, ao passar por seu crivo as ações
corajosas ou covardes dos homens, as problemáticas sociais, as belezas criadas
pelos artistas, os movimentos instintivos dos animais, as explosões fenomênicas
da Natureza. A primeira vez que a História do Cinema em Natal foi registrada
pelo suplemento Nós do RN foi no nº 13, de dezembro de 2005.
Uma segunda
vez foi no nº 52, de agosto de 2009, onde foi contada exclusivamente a história
do primeiro cinema a existir na cidade, o Cinema Natal, que não tinha prédio
próprio, funcionando no interior do então Teatro Carlos Gomes (atual Teatro
Alberto Maranhão). Portanto, a história dos chamados cinemas de rua natalenses
já está um pouco fixada nas páginas destes números mencionados. O que desejo
comunicar agora aos leitores do suplemento, são detalhes do relacionamento das
pessoas com os cinemas e com os filmes vistos em velhos e novos cinemas da
capital norte-riograndense.
Primeiro, o susto e o deslumbramento mesmo ainda antes dos cinemas.
Naquela noite de sábado, 16 de abril de 1898, Nicolau Maria Parente, que
chegara à cidade com um estranho aparelho chamado cinematógrafo, fez com que, da projeção de luz do aparelho na
parede de um depósito de açúcar, começassem a se animar fotografias. Alguns
espectadores quiseram correr com medo, ao verem uma locomotiva vindo em toda
disparada daquele foco de luz, em risco de “atropelar” perigosamente as pessoas
(era o pequeno filme “A Chegada do Trem”, de Luis Lumière, um dos inventores do
cinema.
Do Politeama ao São
Pedro
Algum tempo
depois, foi a inauguração do primeiro cinema em prédio próprio. Era o tempo do
governador Alberto Maranhão, um jovem administrador, que revolucionou a
fisionomia urbana de Natal, inaugurando a luz elétrica da cidade a 02 de
outubro de 1911. O Cinema Politeama, a primeira casa de espetáculos construída
especificamente para mostrar filmes, em Natal, foi inaugurado a 08 de dezembro
do mesmo ano. O nome fora escolhido através de concurso no jornal A República,
por sugestão do leitor do jornal Orículo Silva, que como prêmio ganhou ingresso
aos filmes durante um mês.
O primeiro cinema do bairro Cidade Alta, o Royal Cinema, foi inaugurado
entre as ruas Vigário Bartolomeu e Ulisses Caldas, na segunda-feira, dia 13 de
outubro de 1913. Na época, a direção do novo cinema já se preocupava com a
poluição ambiental, pois nas paredes tinha um aviso proibindo fumar no recinto
do cinema. Mas alguns espectadores não ligavam ao aviso e continuavam tirando
suas baforadas. Quando chegava o São João, a meninada, com algazarra, provocava
mais fumaça queimando traques e bombas, além de cobrinhas que corriam às vezes
para debaixo das saias das espectadoras.
O Teatro Carlos Gomes, que já
abrigara em seu interior o Cinema Natal, passou a ser mesmo cinema a partir de
13 de outubro de 1928, um sábado, com o título Cine-Teatro Carlos Gomes. As
crianças natalenses tiveram um motivo para irem ao cine-teatro a 24 de abril de
1932. É que, neste dia, com a apresentação de um filme publicitário sobre o
inseticida Flit (aquele do “soldadinho na lata amarela com a faixa preta”), as
crianças que ali compareceram ganharam soldadinhos de brinquedo (os famosos “soldadinhos
de chumbo” que fizeram a alegria de tantos meninos de outras épocas).
Adultos também ganhavam brindes nos cinemas. Do cinema Rex, na Cidade
Alta, inaugurado a 18 de julho de 1936, pode-se tirar exemplos desta
distribuição de brindes. As mulheres que foram ao cinema a 04 de junho de 1941,
receberam amostras do esmalte Fátima
e das águas de colônia Serenata e Volúpia. Outro tipo de brinde, para
homens, na época do carnaval, era caixas com vários tubos de lança-perfume, sem
proibição policial ainda não existente, e aproveitando que os cinemas exibiam
no referido período filmes carnavalescos, projetando na tela os cantores
famosos vindos do rádio.
E é claro que retrato era uma
coisa muito valorizada pelo espectador da era de ouro do cinema. Em Natal,
meninos se reuniam em frente aos cinemas Rex e São Pedro (este inaugurado no
Alecrim, na Noite de Natal de 1930), para formarem a feirinha de troca, venda e
compra de revistas de histórias em quadrinhos. Também
apareciam nas mãos da criançada os famosos álbuns de figurinhas, as estampas
Eucalol, e os álbuns com as fotos de astros e estrelas do céu do espetáculo
hollywoodiano. Muitas vezes, se escrevia para os próprios artistas que, de
volta, mandavam as fotos autografadas.
Novidades desde a
Segunda Guerra
Aliás, durante a Segunda Guerra Mundial, muitos atores e atrizes de
Hollywood passaram por Natal, indo em direção ao front, eles para combaterem,
elas para se apresentarem em shows no front. Dentre as atrizes que passaram por
Natal, estava Kay Francis. Tendo oportunidade de vê-la ao vivo, o jornalista
Venturelli Sobrinho publicou no jornal A República um artigo com entusiásticos
elogios à beleza e ao talento dela. Alguém leu e traduziu o artigo para ela,
que, sensibilizada, escreveu uma carta ao jornalista agradecendo os elogios.
Outras atrizes inspiravam sonetos aos nossos poetas.
Ao longo da história da Sétima Arte na cidade, espectadores viram muita
violência representada na tela. E também praticaram ou sofreram violência nos
cinemas. Em determinado dia, o Cine Alecrim exibiu poucos minutos do filme.
Como não continuou, os espectadores depredaram, quebrando 10 cadeiras. A 11 de
maio de 1964, um sargento da polícia tentou matar com um tiro um estudante que
assistia um filme no cinema Rio Grande. Alguns outros espectadores se
levantaram, apavorados, e o tiro foi atingir não o estudante mas uma
espectadora que estava na linha do tiro (mas ela não morreu).
Aliás, o cinema Rio Grande merece um destaque: caracterizou-se como
lançador de novidades tecnológicas, algumas até modificando o jeito do
espectador olhar as imagens. Exemplo: logo nos primeiros anos da década 50
lançou filmes em 3D, Terceira Dimensão, bastante antes do “Avatar” lançado nos
cinemas dos shoppings recentemente, sendo então ou agora necessário o
espectador botar no rosto sobre os olhos as lentes polaróides (óculos
bicolores), que possibilitam ler o processo de construção da imagem em 3D. O
cinema Rio Grande também lançou em Natal filmes cinemascope.
A melhor interface seria o próprio espectador passar à prática, para se
modificar na cena do cine-mundo, atendendo ao convite da fala fala final de
Chaplin em “O Grande Ditador”: “Vós, o povo, tendes o poder de tornar esta vida
livre e bela. De faze-la uma aventura maravilhosa. Vós, o povo, tendes o poder
de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Lutemos por um mundo novo, um
mundo bom que a todos assegure o ensejo do trabalho, que dê futuro à mocidade e
segurança à velhice.” Este filme eu vi, pela primeira vez, no cinema Rex, a 09
de setembro de 1961.
Quando e onde passaram em Natal alguns filmes-marcos
(necessariamente, não é colocada aqui a primeira data em que o filme foi visto
em Natal, mas também reprisis, quando não foi possível encontrar a data do
lançamento na cidade):
A Chegada em Gôndola,
pequeno filme-documentário de Promio, o cinegrafista dos irmãos Lumière, filme
realizado em 1896 e que criou o travelling
(movimento de câmera, deslisando ao longo de objetos e personagens ,
aproximando-se ou afastando-se deles); foi mostrado na primeira sessão de
cinema apresentada em Natal, em um depósito de açúcar, na Ribeira, na noite de
sábado, 16 de abril de 1898.
Cine-Jornal do Rio
Grande do Norte, primeiro filme realizado no Rio Grande do Norte, dirigido
por Anfilóquio Câmara em 1924, foi mostrado em première nos cinemas Politeama e
Royal Cinema, a 18 de outubro de 1924.
Volga-Volga, o
primeiro filme cantado e musicado, sincronizado o som às imagens via uma
eletrola Victor, e dirigido por Tourganski, foi visto pela primeira vez em
Natal no Cine-Teatro Carlos Gomes, a 08 de maio de 1930.
Branca de Neve e os
Sete Anões, primeiro desenho animado em longa metragem, produção dos estúdios
Disney, estreou em Natal no Cinema Rex, a 22 de junho de 1939.
Cidadão Kane,
filme dirigido por Orson Welles, revolucionando a linguagem do cinema com a sua
multiplicidade de planos, estreou em Natal no Cinema Rex, a 26 de fevereiro de
1943.
O Manto Sagrado,
do diretor Henry Koster, estreando filmes em cinemascope em Natal, estava sendo
exibido no Cinema Rio Grande a 25 de junho de 1955 (aliás, foi mesmo o primeiro
filme realizado na dimensão cinemascope).
Glória Feita de
Sangue, um dos melhores filmes anti-guerra, dirigido por Stanley Kubrick,
iniciou a 16 de fevereiro de 1963, no Cinema Rex, as sessões de Cinema de Arte
promovidas pelo Cine Clube Tirol.
Contos da Lua Vaga,
do diretor japonês Kenji Mizoguchi, um dos mais belos trabalhos fotográficos no
cinema, foi apresentado no Cinema Rex a 21 de novembro de 1964.
Oito e Meio, de
Federico Fellini; as imagens cinematográficas traduzindo fielmente as imagens
nos sonhos de um diretor de cinema, ou seja, metalinguagem neste filme mostrado
no Cinema Rio Grande a 06 de agosto de 1967.
Woodstock, o
melhor documentário sobre o famoso festival de música hippie acontecido numa
fazenda do estado de Nova Iorque (EUA); dirigido por Michael Wadleigh, o filme
se fragmenta dinamicamente em vários planos opcionais à visão do espectador,
simultaneamente: foi visto no Cinema Rio Grande a 24 de outubro de 1980.
Deus e o Diabo na
Terra do Sol, a revolução de linguagem efetuada por Glauber Rocha no cinema
brasileiro, via Cinema Novo; estava em cartaz no Festival Glauber Rocha, no
cinema Rio Grande, a 25 de setembro de 1981.
Um Corpo Que Cai,
de Alfred Hitchcock; verdadeiro poema dramático que começa com puro poema
gráfico, nos créditos de apresentação criados por Saul Bass; além de vezes
anteriorea, foi mostrado no Cinema Rio Grande a 15 de agosto de 1986.
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