15 de abril de 2014

A educação no Brasil sob a ótica das necessidades e possibilidades.


 Nos últimos anos, o debate público brasileiro está submetido à comparação do "Brasil do passado" versus o "Brasil do presente". Olhando pelo retrovisor, o país de fato caminhou a passos largos. Há 60 anos, o que é muito pouco em termos históricos, o Brasil era um país eminentemente agrícola, com baixíssimos índices de acesso à educação e à cultura.

         Chegando mais perto, por volta da década de 1980, os períodos de super e hiperinflação, somados às crises de empregabilidade, prejudicaram e sobretaxaram os mais pobres, intensificando ainda mais as gritantes desigualdades socioeconômicas e civis brasileiras. Diante do passado próximo, não há dúvida de que o Brasil mudou... e mudou para melhor.

            Por característica de formação (em Ciência Política), ainda que reconheça o mérito dos governos como atores políticos determinantes, considero que o motor dos avanços nacionais é o aparato institucional estabelecido e desencadeado pela Constituição Federal de 1988, fruto de um dos mais interessantes capítulos de negociação da história brasileira. Mais que qualquer outro fator, foram o processo político de construção da Carta Magna e seu próprio conteúdo os elementos determinantes para demarcação das regras e objetivos do jogo democrático no Brasil, dando a régua e o compasso a todos os agentes públicos (sociedade civil, partidos, Estado).

          No entanto, o país convive com uma contradição fundamental: o flagrante descumprimento dos ditames constitucionais. Restringindo a análise às políticas educacionais, o Brasil ainda não foi capaz de consagrar qualquer um dos princípios sob os quais deve ser universalizado o direito à educação. Para citar apenas alguns, não garantimos a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, a valorização dos profissionais da educação ainda é uma quimera distante e a gestão democrática parece ser algo irrealizável. Consequentemente, estamos muito distantes de consagrar um padrão (mínimo) de qualidade educacional.

             Embora a alfabetização, que por determinação constitucional, devesse ter sido universalizada em 1998, ainda hoje, mais de dez anos depois, não foi garantido o direito elementar à educação a cerca de 14 milhões de brasileiros analfabetos. Igualmente grave quanto é o fato de que os estudantes brasileiros aprendem pouco, sejam eles alunos de escolas públicas ou privadas.

E, se mesmo na educação, o olhar pelo retrovisor também nos anima diante de um passado extremamente desolador, o olhar sincero e cuidadoso para a situação presente de nossas escolas públicas é gravemente desanimador. Diante desse dilema, o debate educacional brasileiro não pode se restringir à comparação do "Brasil do passado" com o "Brasil do presente". Esse exercício comparativo não é capaz de fazer avançar a consagração de um direito humano há anos desrespeitado no país. Com efeito, ele não é suficiente para engendrar um futuro melhor.

         Diferentemente, é preciso analisar quais são nossas necessidades em termos de direitos educacionais e quais são nossas possibilidades (orçamentárias, institucionais, políticas). Apenas sob esse prisma é que se pode buscar meios de melhorar o ritmo (lento!) de melhoria dos indicadores educacionais brasileiros, ainda tão vergonhosos.

          No final de dezembro, a revista britânica "The Economist" publicou uma matéria sobre a situação da educação no Brasil. Embora com alguns erros, o texto analisa o estudo sobre os indicadores educacionais brasileiros empreendido pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico da Organização das Nações Unidas). Para os britânicos, saímos de uma situação "desastrosa" para "muito ruim" e teremos muita dificuldade para alcançar uma situação mediana..


(Daniel Cara- Mestre em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP), é coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação)

Nenhum comentário:

Postar um comentário